21/07/2014

E daí que ela é formada em Letras?

Sendo formada em Letras (quase 3 vezes, se contar a graduação, mestrado e o doutorado) fica meio difícil não me manifestar sobre a "notícia" dos últimos dias: "Formada em Letras, garota de programa narra em livro experiência com alta sociedade"; "Formada em Letras, Lola Benvenutti vai além da web e lança livro para falar de sua vida como garota de programa", "Formada em Letras, garota de programa lança livro sobre sua experiência sexual com a alta sociedade"; "'Me pedem até autógrafo', diz garota de programa formada em letras".
De todas as "notícias" que li a única coisa que identifiquei como relativa a área de Letras foram menções às tatuagens que Lola fez em seu corpo.

"Nas costas, a jovem tem um verso de Manuel Bandeira tatuado: "...dizer insistentemente que fazia sol lá fora". No pulso esquerdo, uma frase João Guimarães Rosa: "Digo: o real não está na saída nem na chegada. Ele se dispõe para a gente é no meio da travessia". Leia mais em: http://zip.net/bkn5JK

No mais, ela é uma garota de programa comum, nenhum motivo para grandes estardalhaços. Aliás, a história dela é quase a mesma de Bruna Surfistinha, com a diferença de que Lola ainda vive o "auge" dos 15 minutos de fama. Lola não gosta de ser comparada à Bruna.

“Eu nunca quis ser a Bruna. As pessoas são diferentes, não sou melhor ou pior que ela. Me irrita essa comparação”. Leia mais em: http://g1.globo.com/sp/sao-carlos-regiao/noticia/2013/05/me-pedem-ate-autografo-diz-garota-de-programa-formada-em-letras.html

Como falava ontem com uma amiga, também formada em letras, cada um faz o que quer com seu corpo, mas acho que a partir do momento em que optou por ser garota de programa, Lola perdeu um pouco do que supostamente chama de liberdade. Acho que se ela vivesse sua sexualidade apenas porque gosta, sem definir valores, aí talvez estivesse sendo livre. Penso que o fato de cobrar pelo ato e colocá-lo numa relação de consumo e escala de valores a torna sim um objeto. Não consigo ver a liberdade de que ela fala, acho uma posição muito contraditória para se discutir esse tema.

“Meus celulares tocam o dia inteiro, recebo 400 ligações por dia. Gente do Brasil inteiro me dando parabéns e várias demonstrações de carinho. As pessoas me reconhecem na rua e me param para pedir autógrafo. Ganhei até livros e já tenho mais de 5 mil curtidas no Facebook. Minha caixa de e-mail está lotada, já estou até pensando em contratar uma assessora”, disse Lola. Leia mais em: http://g1.globo.com/sp/sao-carlos-regiao/noticia/2013/05/me-pedem-ate-autografo-diz-garota-de-programa-formada-em-letras.html

Muito bem lembrado pela minha amiga é o fato de que a escala de valores nesse caso é tão evidente que uma das coisas que é sempre ressaltada quando se fala dela é a sua formação superior - como se as outras prostitutas sem formação superior valessem menos (e, claro, a formação dela agrega valor ao que ela faz).

O número de clientes dobrou, passando de uma média de cinco para 10 por dia. Lola admite que aproveitou para reajustar o valor do programa em 40%. “Tive que subir um pouco o valor pela demanda, mas prefiro fidelizar o cliente. Leia mais em: http://g1.globo.com/sp/sao-carlos-regiao/noticia/2013/05/me-pedem-ate-autografo-diz-garota-de-programa-formada-em-letras.html

Minha amiga disse também que concorda que a liberdade sexual não é isso e que infelizmente, a mulher que é livre sexualmente ainda é tomada socialmente como puta, vagabunda (com a diferença que não cobra pelo sexo que faz)... E estamos bem longe, beeem distantes de tal liberdade... Completou seu raciocínio pontuando que "se para ser livre sexualmente toda mulher precisar cobrar pelo sexo que fará, jamais haverá liberdade nisso... Agora, acho válido ela dizer que é prostituta, porque assim quis ser e não ficar justificando a sua escolha dizendo que foi maltratada em casa ou coisa assim... Embora, há casos e casos de mulheres que viram na prostituição uma forma de ter acesso "a uma melhor condição de vida".
Penso que o grande ponto de discussão não é o fato de ela ser prostituta, isso é assunto dela. Acho apenas discutível o ponto de vista sob o qual Lola pretende falar de liberdade sexual, pois acredito que o posicionamento dela só contribuiu às avessas na discussão desse tema.
Resumindo, no meu ponto de vista, Lola apenas reforça os já tão grandes preconceitos e tabus relativos à sexualidade feminina. Não vi nada de novo ou interessante sob o sol....

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